Jaiminho do caixão e Graça, a louraça

Após cinco meses, encontro Marcelo Bebiano, caso raro de amizade que se faz depois da curva fechada dos 40. Conhece gente do naipe de Chico Buarque e Romário, mas fala disso do mesmo jeito simples que fala como conheceu o lanterninha aposentado de um antigo cinema da Tijuca.

Me conta que está cansado da ponte aérea Brasília-Rio, e eu, por causa de sua condição atual, aconselho-o a assumir a capital do país como pouso permanente, conhecer os lugares óbvios que ele, diarista das portas em automático, nem desconfia onde ficam.

Mas nossa cidade natal longo vem à baila. E por causa de um assunto que se emenda no outro, que se emenda no outro, no outro e no outro, nos pegamos falando do Jaiminho do Caixão.

Tem esse apelido porque não perde um enterro de famoso. Se o sujeito tem nome em vida, ao bater a cassuleta, pode contar com Jaiminho no velório, segurando a alça dianteira do caixão, de preferência a mais visível para fotógrafos e cinegrafistas. Não sei que estratégia possui, mas arruma um jeito e sempre consegue destaque na parte dianteira do ataúde. Já o vi dar discretas cotoveladas e afastar da frente do caixão parente próximo de defunto famoso.

Outra sobre qual falamos foi a Graça, a louraça, mas esta eu não conheço. Era mulher de dinheiro e exuberância, mas curtia entrar de penetra nas festas da alta. Tinha badalação, Graça estava dentro, sem nem desconfiar quem estava bancando o rega-bofe.

De tanto penetrar nas rodas e por ser muito agradável, começou a ser convidada. “Ah,chama a Graça, ela é ótima!”, e foi aí que sua vida perdeu o sentido: ser convidada não era com ela. Parece que desapareceu, desgostosa.

Só o Rio para ter histórias assim.

Só Marcelo Bebiano para contá-las.

Mentes preocupantes

Fiquei espantado – e assustado – com o resultado da tese de mestrado que uma amiga faz sobre a percepção dos jovens de hoje em dia sobre a ditadura militar.

Estudantes de diversas áreas do conhecimento entendem como “ mal necessário” os 20 anos que os generais passaram sentados na cadeira mais importante do poder no país.

Como justificativa, alegam que a ditadura livrou o Brasil do comunismo, ou seja, fizeram atravessar quatro décadas a paranóia que moveu a UDN e levou às ruas a Marcha com Deus pela Liberdade.

Penso que as respostas não careçam apenas de falta de informação ou visão histórica (como poderia, à época, um Presidente levar o Brasil ao comunismo sendo dono de latifúndios e trabalhista por conveniência política e oportunismo eleitoral?). Quando pensamos que crianças foram torturadas na frente dos pais, passa a ser também falta de qualquer sentimento que se apiede do ser humano.

Mas é de se enxergar nessa postura – paradoxal quando se trata de jovens defendendo forças que combatiam a liberdade – a culpa dos que assumiram o poder na chamada redemocratização. É provável que o costume da corrupção e do uso da política como instrumento de atendimento a interesses particulares tenham impedido o nascimento, no ideal desses jovens, da crença de que a democracia não é perfeita, mas é bem melhor do que qualquer outra opção de governo.

A conduta lamentável de homens públicos nesses quase trinta anos coloca lenha no fogaréu da falta de informação dos que justificam – e indiretamente defendem – a estupidez e a crueldade como prerrogativas de mandatários. E agora, a partir dessa pesquisa, o que mais preocupa é que essa postura não está mais restrita aos conservadores que viveram, apoiaram e muitas vezes fomentaram a repressão. Ela começa a brotar nas mentes que deveriam, até por uma questão digamos hormonal por causa da juventude, defender a liberdade.

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