Brasil X Holanda, 2010*

Não é nenhuma novidade que faltava talento à essa Seleção Brasileira. O que não sabíamos é que também não havia controle emocional. 

A Seleção me lembrou aquele suspeito que confessa a autoria de um crime logo que começa a ser pressionado no primeiro interrogatório na delegacia. E a expulsão de Felipe Melo foi uma confissão de que nosso time estava com os nervos em frangalhos, estranhamente quando ainda ganhava o jogo, quando poderia ter decidido o embate ainda no primeiro tempo, pois, ironicamente, fazia sua melhor apresentação em gramados sulafricanos.

Escrevo essas linhas triste, mas não desiludido. Esse time fez o que se esperava dele: fracassou, comprovou que perdeu tempo o torcedor que alimentou sonhos com uma seleção mal convocada e que ludibriou os mais ufanistas na vitória sem brilho diante do Chile.

Sabe-se lá, mas é de se desconfiar, que interesses pautaram a convocação quando assistimos aos comerciais da Gillete, da Brahma e alguns dos “milhares” dos quais o Robinho participou. Nem falo de Felipe Melo e companhia, para quem a camisa do Bonsucesso já seria pesada demais. Para uma Copa do Mundo, o jogador precisa estar, como se diz na gíria do futebol, na ponta dos cascos. Kaká e Luiz Fabiano estavam longe disso, e deram razão à desconfiança geral da crônica esportiva séria.

É informação errada dizer que a Seleção volta para a casa, porque simplesmente o Brasil não é a casa dela. Entre outros problemas – e isso não é um particular apenas da seleção desta Copa – está a falta de identificação do time com o torcedor, um torcedor que não vê nos estádios brasileiros praticamente nenhum dos jogadores que vestiram a camisa amarela, orgulho nacional.

Essa seleção volta para a casa dela – a Europa – para continuar jogando bem apenas no mundo encantado dos comerciais de TV.

*Na sábado que vem, volta ao blog a coluna literária de Alexandre Pilati

Brasil X Holanda, 1994.

Cada geração de torcedores tem seu jogo inesquecível da Seleção Brasileira. O de meu pai foi Brasil e França, semi final da Copa de 58. Ganhamos de 5 x 2 e entramos na reta final para conquistar nosso primeiro caneco. Meu irmão sempre cita Brasil e Inglaterra, na Copa de 70, o da memorável defesa do Banks na cabeçada do Pelé.

Minha geração não lembra da Copa de 70, portanto até 94 jamais havíamos visto um brasileiro levantar a taça. Da mesma forma que aquele Brasil e França resgatou um pouco o orgulho de quem viu o Uruguai vencer em 50 nas nossas barbas, o Brasil e Holanda de 94 redimiu em parte a derrota para a Itália na Copa da Espanha, em 82, o maracanazzo dos filhos da revolução. Naquele sábado, o show da maior dupla de ataque que vi na Seleção – Romário e Bebeto – levou o Brasil à semi final, mas a verdade é que ali embalamos de vez e metemos a mão na taça. Ficamos esperando apenas a hora de poder levar para casa. Houve ainda, é claro, a bomba santa do Branco, com direito a tiradinha de bunda do Romário, exatamente na hora em que o Brasil dormia em campo e a Holanda era melhor, após ter conseguido o empate.

Assisti ao jogo na redação da TV Bandeirantes, no Rio. À época eu apresentava o telejornal local da emissora, que entraria no ar 40 minutos após o termino da peleja que testou enfartados. Entrei no ar rouco, pedindo desculpas, alegando que milhões em todo o país estavam do mesmo jeito que eu àquela altura. Mas o que eu queria mesmo era dizer que a minha geração estava resgatando a si mesma como torcedora da Seleção.

 

 

Judite

Ela não nos esperava chegar em casa, seu limite não alcançava a alta madrugada, quando não o próprio amanhecer. Mas quando acordávamos, vinha com uma chícara de café preto fumegante, muito embora já fosse quase hora do almoço. Ficava da mesa da sala espiando divertida nossas caras amassadas de ressaca, sentados no sofá, acordados sem termos extamente despertado, tentando entender o que se passava já no meio do dia. E aí, quando afinal engrenávamos nossas histórias de sucessos e fracassos pelos bares da cidade, ela pousava em nós olhos risonhos e fazia um jeito de quem sabia de algumas coisas e desconfiava de outras.

Sempre que eu ia visitá-los, recebia dela um abraço tão apertado que tornava a viagem bem menos longa. Então, o cansaço da estrada, feito lagarta feia e amarronzada, se transformava em borboleta feliz e eufórica despejando novidades e notícias de todos. Logo em seguida, ela me mostrava meu lugar na casa e a cama em harmonia com lençóis esticados, obra perfeita de seu carinho de mãe emprestada.

No jantar, antes de buscarmos outra vez aventuras na noite gelada de Curitiba, ela contava casos da vizinhança de tantos anos da Tijuca, desencavava outros ainda mais antigos da infância em Minas. E ríamos tanto, que se não fosse nossa busca desenfreada pelas ilusões dos vinte e poucos anos, ficaríamos ali em meio a tigelas vazias de sopa e farelos de pão na toalha.

Os anos passaram e guardei essas lembranças em enormes caixas de gratidão. Agora, lendo na tela fria do computador o e-mail curto que não comporta a extensão da tristeza do aviso que me traz, eu choro lágrimas sinceras do filho que dela fui em algum momento da vida.

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